O desenvolvimento do modelo Mundell- Fleming está associado não apenas aos trabalhos de Mundell entre 1962 e 1963, mas também ao de Fleming de 1962, em que são apresentados os efeitos de curto prazo das políticas monetária e fiscal em uma economia aberta (o setor externo é incorporado ao modelo) através de uma análise aparentemente simples, porém fornecendo numerosos elementos para a formulação de políticas. Neste modelo são detalhados os diversos aspectos associados à eficácia das políticas monetária e fiscal sob diferentes regimes cambiais e graus de mobilidade de capitais. Mundell, entre 1962 e 1963, introduz o comércio internacional de bens e serviços e de capital ao chamado modelo IS/LM desenvolvido por Hicks em 1937 para uma economia fechada, com o intuito de mostrar que a eficácia das políticas de estabilização estava associada ao grau de mobilidade de capitais e a escolha do regime cambial. A principal lição a ser assimilada é de que a adoção de um regime de câmbio flexível aumenta a eficácia da política monetária e reduz a da política fiscal, e o oposto ocorre sob câmbio fixo. O Modelo Mundell-Fleming mostra que onde há um elevado grau de mobilidade de capitais e igualdade entre as taxas de juros interna e externa, e um regime de câmbio fixo, a satisfação da demanda por divisas (moedas externas) resulta na perda do controle da oferta monetária. Esta passa a ter um ajuste passivo à demanda por moeda que reflete o grau de liquidez interna. Mundell afirma que no caso de rigidez da taxa de câmbio, políticas implementadas para tornar a política monetária interna através das operações de mercado aberto (compra e venda de títulos pelo governo para controlar a liquidez) acabam não sendo eficazes, pois não são capazes de afetar a taxa de juros ou a taxa de câmbio. Por outro lado, as políticas fiscais associadas, por exemplo, a gastos crescentes do governo têm a capacidade de aumentar a renda interna e o nível de atividade econômica sem a implicação de elevar a taxa de juros ou apreciar a taxa de câmbio. A elevação dos juros é indesejada, pois afetaria negativamente os investimentos. A valorização do câmbio desestimulando as exportações e estimulando as importações também, pois prejudicaria o ajuste das contas externas, gerando déficits comerciais e em transações correntes do balanço de pagamentos. A adoção de um regime de câmbio flexível puro (clean float), isto é, onde o Banco Central não intervém e a taxa de câmbio é determinada pelas forças de oferta e demanda no mercado de divisas, provoca uma perda de eficácia da política fiscal e uma retomada da eficácia da política monetária. Tal conclusão pode ser verificada através do exemplo no qual mantendo-se a política monetária inalterada, um aumento dos gastos do governo (política fiscal) gera uma maior demanda por moeda e pressões para um aumento na taxa de juros. O aumento da entrada de capitais atraídos pela taxa de juros valoriza o câmbio e a redução nas exportações e no saldo comercial neutraliza o chamado efeito expansionista da política fiscal, que se torna ineficaz. Em sentido contrário, a expansão da oferta monetária (política monetária) pressiona a taxa de juros para baixo e estimula a atividade econômica e ao mesmo tempo desvaloriza o câmbio, provocando o aumento das exportações e do saldo comercial e, portanto, influindo sobre a renda e o produto interno, tornando-se desta forma eficaz. O trabalho de Mundell de 1963 sistematiza os efeitos das políticas monetária e fiscal sob câmbio fixo e flexível, assumindo alta mobilidade de capitais, além de detalhar as consequências de políticas alternativas como o financiamento de déficits fiscais por parte do Banco Central. A discussão desenvolvida por Mundell (1963) revela que sob condições de alta mobilidade de capitais um país não pode manter um diferencial de taxa de juros em relação ao nível dos juros internacional. E, com taxa de câmbio flexível o Banco Central não pode intervir para fixar uma dada taxa de câmbio, ainda que isso não impeça de atuar na compra e venda de divisas. A representação gráfica do modelo com as curvas XX (mercado de bens), FF (balanço de pagamentos) e LL (mercado monetário) na versão original de Mundell (1963) foi posteriormente modificada com a utilização das curvas IS, LM e BP. O modelo Mundell-Fleming é reconhecido por sua grande contribuição para o desenvolvimento da macroeconomia aberta, porém algumas de suas limitações tornaram-se claras nos anos vindouros à sua formalização. Dentre estas limitações, destacam-se os supostos simplistas sobre a formação de expectativas nos mercados financeiros e a rigidez dos preços no curto prazo. Estas limitações foram superadas em pesquisas posteriores, como é o caso do trabalho de 1976 de Dornbusch sobre a dinâmica da taxa de câmbio em um modelo que incorpora a noção de expectativas não estáticas (racionais) dos agentes em um modelo de economia aberta. Ainda assim, a robustez dos resultados do modelo Mundell-Fleming pode ser considerada significativa mesmo com o rompimento destas duas hipóteses originais. As Figuras 1 e 2 representam, respectivamente, os efeitos das políticas monetária e fiscal sob condições de perfeita mobilidade de capitais.
[INSERIR GRÁFICO]
Considerando o caso de perfeita mobilidade de capitais, podemos sistematizar os efeitos da política monetária e fiscal sob câmbio flexível e fixo na sequência. O processo de ajustamento de uma política monetária expansionista com câmbio flexível se dá de tal forma que inicialmente a curva LL (LM) se desloca para baixo, aumentando o nível de renda, sendo que caso a alteração na oferta monetária seja maior do que a demanda por moeda (efeito renda), ocorre uma queda na taxa de juros, uma consequente fuga de capital, e a necessidade de uma desvalorização cambial (nominal e real) que melhore o saldo comercial e desloque a curva XX (IS) para cima, com nova elevação na renda e retorno da taxa de juros para seu nível externo em função da perfeita mobilidade de capitais. O resultado é a eficácia da política monetária sob câmbio flexível. O processo de ajuste de uma política fiscal expansionista com câmbio flexível envolve um deslocamento da curva XX (IS) para cima, aumentando o nível de renda e a demanda por moeda, resultando em uma elevação da taxa de juros, entrada de capital e uma consequente pressão em termos de apreciação (nominal e real) da taxa de câmbio, que piora o saldo comercial e desloca a curva XX (IS) para baixo. O processo resulta em um retorno ao nível de renda inicial e à taxa de juros externa, ficando evidente a ineficácia da política fiscal sob câmbio fixo. O ajuste envolvido na adoção de uma política monetária expansionista com câmbio fixo ocorre através de um deslocamento inicial da curva LL (LM) para baixo, resultando em um aumento da renda e uma diminuição da taxa de juros, aumento das importações, piora no saldo comercial e deterioração do balanço de pagamentos FF (BP) associado a uma queda das reservas internacionais e diminuição da oferta monetária (sem esterilização) que desloca a curva LL (LM) para cima, retornando ao nível de renda inicial e à taxa de juros externa. O resultado é uma ineficácia da política monetária sob câmbio fixo. O processo de ajuste resultante da adoção de uma política fiscal expansionista com câmbio fixo envolve o deslocamento da curva XX (IS) para cima, aumentando o nível de renda e a taxa de juros, implicando em uma alteração na demanda por moeda e, portanto, na própria taxa de juros que fica acima da taxa de juros externa, situação esta associada a uma entrada de capital e melhora no balanço de pagamentos FF (BP), aumentando assim as reservas internacionais com impacto expansionista na oferta monetária (assumindo não esterilização), o que desloca a curva LM para baixo, resultando em um aumento da renda e mantendo a taxa de juros atrelada à taxa externa. O resultado deste processo é marcado pela eficácia da política fiscal sob câmbio fixo. Os resultados das políticas monetária e fiscal sob imperfeita, ainda que significativa, mobilidade de capitais revela que no caso de uma política monetária expansionista sob câmbio fixo a expansão monetária desloca a curva LL (LM) para baixo, resultando em um aumento da renda e uma piora no saldo comercial via aumento das importações, e aliada a uma situação de excesso de oferta no mercado monetário resulta em uma queda na taxa de juros e fuga de capitais, piorando ainda mais o saldo comercial e o ajuste do balanço de pagamentos FF (BP). O processo está associado a uma perda de reservas internacionais, contração monetária caso não haja esterilização, e um deslocamento da curva LL (LM) para cima, e ao final não há impacto sobre o nível de renda e a política monetária se mostra ineficaz. Já o ajuste a uma política fiscal expansionista sob câmbio fixo e imperfeita mobilidade de capitais revela que a expansão fiscal desloca a curva XX (IS) para cima, resultando em um aumento da renda e uma piora do saldo comercial via aumento das importações, e um desequilíbrio no mercado monetário via excesso de demanda por moeda que eleva a taxa de juros e atrai capitais. Caso o aumento dos fluxos de capitais predomine sobre a deterioração das transações correntes, ocorrerá um superávit no balanço de pagamentos FF (BP), aumentando as reservas internacionais com impacto positivo sobre a oferta de moeda (sem esterilização), deslocando a curva LL (LM) para baixo, e o resultado final é um novo aumento da renda e queda relativa (parcial) da taxa de juros, resultado este que indica eficácia da política fiscal sob câmbio fixo e imperfeita mobilidade de capitais. Sob câmbio flexível e imperfeita mobilidade de capitais, a expansão monetária desloca a curva LL (LM) para baixo, aumentando o nível de renda e as importações, que piora o saldo comercial, e caso o aumento da oferta monetária seja maior do que a demanda por moeda, ocorre uma queda na taxa de juros, fuga de capital e déficit no balanço de pagamentos Ff (BP). O ajuste requer uma desvalorização cambial (nominal e real) para equilibrar as contas externas e melhorar o saldo comercial, resultando em um deslocamento da curva XX (IS) para cima e uma eficácia da política monetária. A expansão fiscal sob câmbio flexível e imperfeita mobilidade de capitais implica em um deslocamento da curva XX (IS) para cima, aumentando o nível de renda e as importações (efeito renda), piorando o saldo comercial e aumentando a demanda por moeda que eleva a taxa de juros acima do nível externo. Tal situação está associada a uma entrada de capital, dado que o aumento dos fluxos predomina em relação à deterioração do saldo comercial, e o resultado é uma apreciação cambial (nominal e real), deslocando a curva FF (BP) para cima. Associado a este deslocamento está uma piora do saldo comercial, e o consequente impacto na demanda por bens domésticos, deslocando a curva XX (IS) para baixo, sendo que o processo de ajuste se consolida através de uma queda parcial da renda e na taxa de juros, ou seja, a política fiscal se torna menos eficaz. Veja também Mundell, Robert.